Sim. O que vemos nas ruas em termos de manifestações e insurgências
é basicamente política em Estado bruto; dinâmica, processual, criativa,
disruptiva. A política não se reduz ao vazio demagógico, por vezes, apresentado
no congresso, não se resume ao ativismo puro cuja ação irreflexiva recaí em mero vandalismo.
A
política é poder constituinte; poder em movimento, aberto, inacabado,
infinitamente poderoso e expansivo, que não se deixa capturar pelo
constitucionalismo, que se esquiva das cooptações institucionalizantes, que
foge das medidas castradoras, despreza os comandos da hierarquia e, por fim,
aniquila mediante a cooperação os bloqueios e constrangimentos que ousam anular a liberdade e fazer dessa
anulação privilégio de poucos.
Na perspectiva de Negri podemos pensar o Estado, suas instituições
e o atual sistema político com seus partidos e política tradicional como partes
do atual poder constituído na sociedade, poder que se nutre da criatividade e ânsia de mudança da multidão ao
mesmo tempo que isola e neutraliza suas forças inventivas. Trata-se de um
poder, contudo, que se encontra amplamente contestado e desqualificado em
muitos níveis e escalas, carente de legitimidade, com déficit de democracia e
superávit de burocracia e tecnocracia. Mostra-se incontornavelmente como
obstáculo para o desejo desmedido de coletividades que ousam ampliar os limites
do possível, especialmente os limites da democracia.
Ultrapassar esse obstáculo
deve ser imperativo existencial da política bruta que derramam
plural e difusamente pelas ruas do Brasil, deve ser objetivo inelutável para
reconduzir a soberania as suas origens,
deve ser enfim, horizonte de radicalização
da democracia, cujo resultado se
expressará em uma nova relação entre Estado e Sociedade certamente menos
unilateral e domesticadora e mais cooperativa e dialógica.
Mas sem
ingenuidades, a superação das medidas, comandos e privilégios passa imediata e
necessariamente pela intensificação das resistências, lutas e disputa
autodeterminada dos sentidos e interpretações do próprio movimento que se realiza enquanto poder que desestabiliza e
reinventa o pensamento e a prática da política.
Poisé, to lendo Negri! O poder constituinte.