sábado, 20 de setembro de 2014

Saída do Brasil do Mapa da Fome da ONU e Esgotamento histórico do PT

Foto: A saída do Brasil do Mapa da Fome da ONU é resultado do trabalho de muitos brasileiros e brasileiras.

Imagem: Exército das Estrelas


         Trata-se de um avanço inegável, mas será que o PT possui condições de aprofundar as melhorias? Será que possui força para emplacar uma reforma política? coragem para uma reforma tributária? Ousadia para tratar as pautas relacionadas ao aborto, questão LGBT, questão indígena etc..? Fico pensando se a derrota do PT não seria importante para a vitalidade do PT enquanto partido de esquerda, isto é, para sua requalificação interna à esquerda e certamente para sua reconexão em termos mais radicais com os movimentos sociais.
    Considerando a conjuntura internacional não muito favorável, a tendência de crescimento pífio e o aprofundamento de críticas e ataques de uma direita que se desespera depois de tanto tempo longe do poder, penso que a vitória do PT abre um cenário tenso, imprevisível, exigindo uma radicalização das transformações democráticas para que ele se sustente enquanto partido de esquerda legítimo ou então se consolidará definitivamente um PT à direita, truculento, anti-democrático, gerencial, pragmático, enterrando de vez o que resta de forças à esquerda, minoritárias no seu interior. De qualquer forma ocorre o esgotamento histórico do PT enquanto força transformadora, foi uma sucesso enquanto partido social-democrata, conseguiu conciliar uma relação relativamente estável entre capital e trabalho traduzido em amplos ganhos financeiros para os primeiros e inclusão social e educacional com aumento do salário mínimo, crédito e empregos formais. 
       Eis o desenvolvimento brasileiro realizado pelo PT: desconcentração de renda com impacto na base da pirâmide social (diminuição da pobreza e surgimento da "nova" classe média) associado a concentração de capital financeiro, expresso nos lucros bilionários dos bancos e no pagamento de 47% do orçamento público federal para pagamento de dívida pública. E agora José? Que caminhar seguir? 
        O Fato é que o esgotamento de certas forças históricas abrem caminho e oportunizam a consolidação de novas relações de força, o surgimento de novos atores, propostas e projetos. Só espero que a guinada seja à esquerda.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Conflitos na terra prometida: notas para início de conversa


Convidado para participar de um debate sobre Israel e Palestina fui desafiado (em poucos dias) a pensar sobre um assunto que nunca me posicionei e sempre evitei estudar, abaixo registro algumas linhas que escrevi, as quais se juntaram a outros argumentos e ideias que me surgiram e que não pude transcrevê-las agora.

Nem de longe sou especialista sobre o tema, tampouco  foi objeto de estudo em minhas pesquisas. Apesar disso, escrevo essas mal traçadas linhas para responder ao convite proposto, qual seja, aquele de problematizar as perdas humanas no conflito entre Israel e Palestina, que tem cada vez mais assumido contornos de massacre e não de guerra. Não costumo seguir roteiros prontos a serem lidos em um debate, mas pela minha ignorância sobre o tema, devo ler o breve texto que fiz sobre a questão, sob o risco de não fazendo isso, ceder espaço para os preconceitos de plantão. Registro, desde já, que quando me referir a Israel, estarei falando sobretudo ao governo de Israel, ao grupo político de extrema-direita que tem orientado suas ações enquanto Estado. Condena-se, portanto, ação de um governo e solidariza-se com aqueles que sofrem.
  
Nem morte ao Judeus, nem mortes aos árabes. Nosso desafio é superar preconceitos, racismos e tentar problematizar a razão de tantas morte de civis inocentes, de tanto sofrimento humanos e vidas desperdiçadas em um velho conflito que já contabiliza diversas guerras e várias tentativas de negociação fracassadas. Conflito que prossegue avante, atualizando-se no tempo e no espaço, segundo fatos e eventos que sempre incluem ataques e mortes de ambos os lados.
 Diante desse e tantos outros horrores muitos rezam, oram e até criticam Deus por permitir tamanha aberração  Ocorre que somos dotados de livre-arbítrio  e não devemos transferir nossa responsabilidade humana para anjos e deuses, nós somos responsáveis por todo esse caos; nossa mediocridade, ignorância e arrogância é que legitimam posturas extremas, fundamentalismos, ânsia por dominar o outro e atender a interesses independente dos meios utilizados.
Sim. O primeiro passo é reconhecermos nossa culpa e assumirmos nossa responsabilidade terrena diante do conflito, afinal, somos nós que matamos, odiamos e segregamos por causa de crenças, ganâncias e supostamente para atender os orientações e causas divinas. Os ismos religiosos estão longe criados pelos homens estão longe de contribuir para resolução de nossos problemas , o  exemplo do conflito entre Isral e palestina é emblemático nesse sentido.  Na medida em que não existe separação entre Igreja e Estado, seja por parte do Judaísmo ou Islamismo dominantes na região, o fator religioso será sempre um entrave para as negociações, para a democracia e para paz. Não que as religiões em sí sejam prejudiciais, afinal, enquanto princípios de conduta sempre pregaram o amor, o perdão e a paz, contudo, os seres humanos que as experimentam são demasiadamente imperfeitos, limitados, ignorantes e alguns sim, são perversos e mesquinhos, fazendo dessas atitudes mencionadas apenas palavras ocas. Longe do perdão como forma de superar um passado de horror o que se vê é a reprodução indefinida da vingança como forma de perpetuação do conflito.
Nossa posição, portanto, não pode entrar em clima apaixonado de tipo Fla-Flu, posição que não favorece um entendimento equilibrado da questão. Contudo, buscar um entendimento equilibrado não significa busca a ilusão da neutralidade, afinal, não se pode jamais ser neutro diante do Espetáculo do terror, de processos de expropriação econômica, controle social,  dominação política e toda sorte de discriminações e preconceitos.
Minha posição nesse sentido, é aquela que nega a guerra, o massacre, as mortes, a tortura, os toques de recolher, o cerceamento da liberdade, atitude historicamente hegemônica de um Estado possuidor de imenso potencial militar. Potencial que, a despeito da tecnologia avançada, não consegue deixar de atingir civis, escolas, crianças, inocentes. Potencial precariamente desafiado por mísseis caseiros, pedras e paus.
A disputa ideológica pela explicação do conflito está fervilhando na rede, como evitar simplificações e não incitar ódio, preconceito e demonizações em relação aos povos envolvidos no conflito? Já basta a imagem criado pelos EUA de que todo árabe é potencialmente um homem bomba, representante do “eixo do mal”.
Israel e Palestina. Ambos possuem suas justificativas, razões e versões para o problema. A complexidade do tema não permite divisões moralistas e enquadramentos reducionistas como bem x mal, culpado x inocente, certo x errado etc.Importa registrar que parte da população de Israel é contra os ataques realizados por sua nação e que do outro lado existem partidários e anti-partidários do Hamas em Gaza. Diga-se de passagem, o Hamas é uma organização política formalmente eleita pela população, portanto, legítima.
Porque se importar? Por que não se importar? O que temos haver com esse ccom esse conflito? Onde quer que exista sofrimento humano ele dever interrompido imediatamente, onde quer que vidas estejam sendo ceifadas deve-se intervir com urgência e uma das formas de chamar atenção para esses fatos é informar, debater e criar um opinião pública e uma consciência crítica em torno da questão, sem simplificações que só agravam as possibilidades de pensar o conflito e sua resolução.
Um debate, portanto, mesmo de caráter crítico, deve manter um padrão de diálogo e respeito mútuo, evitando discursos que anulem a razão e a lógica em favorecimento do preconceito e defesa irracional de um ponto de vista.
Nesse sentido, vou registrar alguns pontos de problematização que podem nos ajudar no entendimento da questão:

MITOS ( me perdoem a terminologia antropólogos)

Em primeira lugar, compreender um conflito não é identificar quem jogou a primeira pedra , realizar simples acusões é incitar ódio e discriminação entre povos e entre aqueles que se posicionam diferentemente em relação ao conflito. Ao contrário, temos que mobilizar as pessoas, grupos e povos para cooperação e reciprocidade através do diálogo democrático entre as partes envolvidas. Para esse fim é necessário desconstruir algumas meias verdades e mentiras relativas ao desentendimento.
 Daí a necessidade de descontruir alguns mitos.

             Segundo  Jeremy R. Ramond, alguns deles são:
- Sempre Judeus e árabes estiveram em conflito na região. Trata-se de uma inverdade, qualquer pesquisa histórica honesta vai evidenciar que Judeus e Palestinos coexistiam como sociedade de forma pacífica, salvo eventuais conflitos existente como em qualquer organização social. Sim! Houve uma época em que filhos de Judeus e Palestinos brincavam juntos, assim como seus pais conviviam sem ódio, intolerância e armas prontas para disparar.
- “Direito à existência" de Israel. Ora, “As nações não têm direitos. As pessoas têm. O marco adequado para o debate é o direito dos povos à autodeterminação. A partir desse ponto de vista, é evidente que não são os árabes que têm negado esse direito aos judeus, mas os judeus que negaram esse direito aos árabes. A terminologia israelense sobre "direito de existir" é constantemente empregada para esconder esse fato”
- Deus deu essa terra para os judeus, por tanto os árabes são os ocupantes. Ora,  Trata-se de uma invenção a partir da perspectiva bíblica que não deve legitimar atos genocidas.
- Os palestinos rejeitam a solução de dois Estados, porque eles querem destruir Israel. Ora, “Os representantes eleitos do povo palestino na OLP de Yasser Arafat reconheceram, desde os anos 70, o Estado de Israel e aceitaram uma solução de dois Estados. Apesar disso, a mídia ocidental continuou dizendo na década de 90 que a OLP rejeitou essa solução e em vez disso, queria varrer Israel do mapa”
 - Estados Unidos é um mediador honesto e tem procurado a paz no Oriente Médio. Ora, qualquer análise honesta evidencia o quão infundada é esse argumento. “Deixando de lado a retórica, os EUA sempre apoiaram as políticas de Israel, incluindo a ocupação ilegal e outras violações do direito internacional humanitário. Apoia as políticas criminais de Israel financeira, militar e diplomaticamente.”

Criação do Estado de Israel: Sionistas, Britânicos e ONU

Em segundo lugar: Compreender o conflito, como já registrei, não é simplesmente identificar quem jogou a primeira pedra, contudo, é elementar e tarefa básica para a sua explicação. Consultar o passado para explicar o presente é, portanto, fundamental para entender qualquer conflito.
Nesse sentido, importa registrar que a natureza do conflito vincula-se a  disputa pela posse e soberania de um território que tem como um dos marcos principais a fundação do Estado de Israel em 1948. Diga-se de passagem, uma data explicativa que crava um antes e um depois sobre a história do conflito. Criação inspirada pelo movimento sionista, apoiado pelo governo Britânico e recomendada pela ONU. Desta maneira combinou-se o desejo dos Judeus sionistas em criarem um Estado apenas para Judeus com o desejo colonial Britânico de manter forte em uma região geopoliticamente importante do oriente médio,

A região se encontrava na rota marítima das possessões imperiais britânicas mais importantes: Índia, Sudeste Asiático e África Oriental. E era muito próxima das recém-descobertas jazidas petrolíferas persas, de enorme importância econômica. Também era adjacente ao Egito, onde se localizava o Canal de Suez e onde os britânicos ncontravam dificuldades para controlar os movimentos nacionais. (ZARIF & KUREDA,2012:11)
           

Daí que em 2 de novembro de 1917, o ministro das Relações Exteriores britânico, Lord Balfour, divulgou uma declaração à Federação Sionista. Declarava que:“O governo da Sua Majestade via favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um lar para o povo judeu e realizará seus melhores esforços para facilitar a conquista desse objetivo. A Declaração Balfour, portanto, foi um momento decisivo nessa trajetória, pois apesar de não estabelecer um Estado judeu, deu sinal verde à colonização sionista da Palestina. Afinal, deu esperanças de que o “lar nacional” na Palestina poderia se tornar, no futuro, o Estado judaico almejado. Foi o início da aquisição de terras em massas por parte dos Judeus e expulsão de milhares de camponeses palestinos de suas terras. (ZARIF & KUREDA,2012:11). A declaração de Balfor, portanto, tem um papel importante no entendimento da questão, pois ao tentar encontrar uma solução para “questão dos Judeus” fortaleceu o nacionalismo judaico e cedeu espaço para o sionismo em sua expressão mais acabado, qual seja, a criação de um Estado exclusivamente Judeu.
Quer dizer, foi esse pecado, ou melhor injustiça primordial que expulsou  os palestianos suas terras, nomeadamente em 1948-1950, pelas milícias judaicas e posteriormente pelo exército israelita. E essa injustiça merece reparação e  reconhecimento.(GRESH,2002,p.8), afinal, foi ela quem desencadeou guerras e esteve na origem ou no fortalecimento de grupos extremistas de ambos os lados;que instilou ódio em escala geracional; que consolidou um controle militar e cerceamento territorial e físico da população palestina e seu isolamento pela construção de muros como é caso da Cisjordânia; que colocou a religião no centro de uma disputa pela apropriação de Jerusalém, enfim que criou um sinistro problema de coexistência entre Israelenses e palestinos em uma região em que outrora essa coexistência existia.
A invenção de terroristas palestinos e do terrorismo  de Estado de Israel em contexto ampliado, esteve associado não apenas ao desejo de criação um Estado para um povo historicamente perseguido mas, sobretudo, vinculou-se a processos coloniais e disputas imperiais entre nações para ocuparem um lugar privilegiado na geopolítica mundial. O conflito tem origens modernas e  envolve muito mais que palestinos e israelitas, sempre envolveu as grandes potencias e seus interesses. Os EUA em tempos mais recentes, são aqueles que sob a fachada de “ guerra contra o terror” dinamiza sua industria bélica em coerência com seus interesses geopolíticos no oriente médio. A relação entre EUA e Israel legitima e atualiza a injustiça primordial através de acordos imperialistas que como grande vítima atualmente a faixa de Gaza.
Gaza tornou-se um gueto, sua população encontra-se sob regime de confinamento e discriminação em um “ambiente fechado e inacessível”. Em um passado não muito longínquo tivemos a experiência judia de confinamento e sul-afriacana expressa no apartheid, com muitas diferenças, mas ambas ancoradas em racismo institucionalizado pelo Estado. Israel se apresenta não apenas com feições de Estado terrorista como igualmente Estado que patrocina uma discriminação institucionalizada: do lado de lá todos são potencialmente terroristas, matadores, inimigos.

Nesse território, vive uma parte significativa da população palestina, moram, aproximadamente, um milhão e oitocentos mil habitantes (sendo 450 mil na cidade de Gaza, maior núcleo urbano da faixa), comportando cerca de 5 mil pessoas por quilômetro quadrado”(..)  A fronteira com o Egito – com a ajuda do general-ditador Abdel al-Sisi – está fechada. Do outro lado está Israel. Por fim, a imensidão mediterrânea e seu controle extrapalestino.(QUEIROZ,2014)

Além disso, desde a criação do Estado de Israel, conflito após conflito, o território palestino aos poucos foi sendo apropriado por Israel. O fato é que Israel tem controle de 80% do território da palestina. Para realizar uma comparação, era como se tirassem toda Amazônia do Brasil. Desta maneira, a palestina (que é composto por Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental), que no início do século passado reservava seu território para cerca de 80% de palestinos, após o colapso do antigo império Otomano do qual fazia parte e com a criação do Estado de Israel simplesmente viu minguar seu território e mais de 700 mil de seus habitantes foram obrigados a sair de suas terras.
Morte é morte, atentado aos direitos humanos é atentado aos direitos humanos em qualquer lugar do mundo, é por isso que, apesar de nossos problemas, não devemos olhar com indiferença e naturalidade a perversidade e injustiça que ocorre no desenrolar desse conflito. Quem sabe com a pressão da opinião pública mundial tenhamos a oportunidade de ver realizar-se a autodeterminação da palestina mediante um Estado próprio, sem que para isso haja mais sangue derramado ou a destruição de outro Estado.

Referências

DUPAS,Gilberto & VIGEVANI,Tullo(org).Israel-Palestina A construção da paz visra de uma perspectiva global. São Paulo. Editora Unesp..2002
GRESH,Alain. Israel, Palestina: verdades sobre um conflito. Tradução de Lígia Calapez Gomes. Campo das letras.2002
Queiroz ,Fábio José Cavalcanti de. O gueto de Gaza e a “solução final” de Netanyahu. http://blogconvergencia.org/blogconvergencia/?p=2467 acessado em 26.08.2014

ZARIF, Hassan & Kureda, Rui.  A causa palestina. São Paulo. Central única dos trabalhadores,2012

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Danilo Gentilli são milhões

           Quando mais 800 milhões de pessoas passam fome no mundo considerando que existe comida suficiente para alimentá-los; quando desastres ecológicos se tornam mais recorrentes e nada se faz para bloquear os processos poluição e degradação da natureza; quando crises políticas e econômicas assolam o mundo, empobrecem países, potencializam problemas sociais e aprofundam o abismo das desigualdades; quando mesmo sabendo disso (apenas uma pequena mostra do que poderia ter sido registrado) você conclui que o mundo “é assim mesmo”, e que vale a pena defender o capitalismo da crítica daqueles que defendem outros modos de produção e civilização alternativos é sinal de que você foi “bem educado” para reproduzir esse sistema; que tudo que foge a sua lógica de dominação, exploração e lucro é tratado como anomalia, desvio, irracionalidade. 

       Danilo Gentilli são milhões; milhões que padecem de uma cegueira analítica, de um olhar demasiadamente estreito e de uma forte incapacidade para compreender que nosso presente uma dia foi apenas possibilidade histórica, uma opção dentre muitas, que esse presente lança raízes em um passado que estivera prenhe de alternativas. Nesse sentido, não há razão alguma para pensar que não temos alternativas face o sistema dominante. Elas existem em estado embrionário em idéias e práticas, merecem nossa atenção e reconhecimento. Quem sabe sua construção pode ser potencializada através de um ato pouco valorizado: o voto, especialmente aquele direcionado para as forças minoritárias, progressistas, aquelas que não tiveram oportunidade de colocar em prática seus conceitos, idéias , programas e projetos.