Estamos
tentando eliminar um sintoma quando na verdade a raiz da doença sai ilesa. É
claro que quando não nos sentimos protegidos e estamos vulneráveis – como na
atual conjuntura - tendemos a apelar para medidas mais duras e conservadoras,
mas tais medidas não equacionam o problema. Poderemos criticar e condenar
amplamente esses menores quando nossa sociedade oferecer Oportunidades iguais
para todos, educação de qualidade para todos, salário decente para todos,
direitos que criam de fato igualdade de oportunidade. Se depois disso - o que
no sistema capitalista não vai acontecer - o menor continuar
"aprontando" aí sim podemo emitir as desqualificações de toda sorte.Enquanto
tivermos desigualdades abissais de renda, poder, oportunidade e qualidade de
vida, muitos sintomas terríveis vão aparecer e se reproduzir no corpo social e
os discursos do Exemplo e da meritocracia serão nulos e falsos...
Me explico precariamente..
Trata-se de um
falso problema; diminuir a idade ou não
simplesmente não resolve nosso problema, embora certamente alguns indivíduos e
famílias fiquem “menos pior” ao saberem que os menores estão na prisão e não
vão realizar outros crimes estando soltos.
É preciso
dizer que diminuir a maioridade penal não reduz a criminalidade dos “menores”
porque muitos realizam o crime mesmo sabendo que eles vão para prisão, mesmo que tenham penas mais duras, mesmo que
venham a morrer no ato. Certamente não
é uma justificativa, mas deveríamos nos perguntar porque alguém realiza
delitos, rouba ou mata ? é acaso por simples prazer, profissão, sensação de
aventura, simples maldade? Eles fazem isso porque?
SIMPLES ESCOLHA?
Não é
simplesmente uma questão de liberdade, de mera escolha, de um certo x errado
maniqueísta e tampouco “passar a mão na cabeça de vagabundo e marginal” como
dizem por aí.
Acaso ele teve
a oportunidade de escolher a família, o bairro, o país e a classe social onde
nasceu?
Certamente
existe alguma dimensão de escolha e de caráter, mas não é uma variável
definidora da violência em geral e da violência juvenil em particular.
Ouvi um comentário
de que muitos roubam para ter seu tênis
e camisa de marca etc. Mas acaso ele tem condições (dinheiro, emprego) para
comprar um? Não é justificativa para o crime e bandidagem, mas tbm é uma
variável que entra na explicação, até porque mesmo sendo um assalariado terá
dificuldades para ter o que quer enquanto outros jovens o terão sem trabalhar,
simplesmente porque nasceram em outra família, bairro, classe ou pais.
Que o menor
deve pagar pelo seus atos e crimes cometidos, isso não se discute, a justiça
deve ser feita independente de classe, cor e gênero (Embora saibamos que os
favores da lei servem mais para uns e o rigor da lei para outros). O que se
discute é a eficiência/finalidade de encarcerá-los juntamente com os demais
criminosos, o que só irá ampliar as influências de uma psicologia e
sociabilidade negativas.
Não é uma
simples questão simplista e maniqueísta de que pobre está fatalmente condenado
a realizar o crime ou ao contrário, o rico e bem instruído não comete
crime..Não é esse o caso. Estamos falando de tendências, regularidades, “leis”
sociológicas que condicionam as possibilidades sociais e psicológicas da
criminalidade. Em outras palavras, uma pessoa ser pobre ou negra (ou pobre e negra) não significa que
fatalmente ela vai realizar crimes, mas significa que por dimensões estruturais e
de contexto de socialização marcados por desigualdades, pobreza, exclusão e
outros fatores eles certamente vão ter “mais chances” ou menos resistência para
realizar certas práticas.
Não podemos entender o “caráter” de um
indivíduo fora dos contextos sociais, fora da sociedade em que vivemos, o
indivíduo não existe como abstração, ele existe como pessoa de carne e osso que
sofre os condicionamentos de um modo de
produção e civilização que está longe de se fundar na meritocracia, se funda antes,
na exploração do homem pelo homem e na obtenção de lucro a qualquer custo
independente do sofrimento humano e contradições que possa causar.
Resposta a alguns comentários.
Acaso “é a cor da pele que
define caráter?” ..
Cor da pele
não define caráter, mas o condiciona, ou vivemos em sociedade sem racismo? Um
branco e um negro são vistos da mesma maneira em uma entrevista de emprego? O
negro teve a mesma história social herdada que a do branco? Meritocracia do Brasil
existe?
Cor da pele
não define caráter, mas define preconceito, define aprisionamento, define
exclusão, define estigmas e estruturas de classificação, inferiorização etc..
... "Educação vem de berço!"
E que adorável berço tem a maioria da
população brasileira né? Porque qui existe meritocracia, temos um ótimo sistema
educativo, não temos pobreza e desigualdades abissais ou classes sociais; aqui
todos tem oportunidades iguais e padrão de vida elevadíssimo, todos nascem com
pais e mães responsáveis e temos um Estado que garante uma ótima segurança para
população, um ágil sistema judiciário, sistemas prisionais ressocializadores
onde os presos estudam e trabalham, sem
contar com as creches para as mães deixaram seus filhos enquanto trabalham,
porque afinal de contas no Brasil todo mundo tem emprego, casa, direitos
garantidos e ganha um ótimo salário, se alimenta bem, tem cultura e lazer de
sobra em seus bairros; aqui no Brasil só entra na criminalidade quem quer, quem
escolhe, por “diversão” e por ambição.
Este é o
Brasil das fadas que não é levado em consideração por alguns que convictamente acreditam ser a redução da
maioridade penal uma solução para criminalidade juvenil, diminuição dos crimes
e da impunidade. Podem baixar até para 15,12, 8 e ainda teremos os adultos de
nossa justa sociedade que cometem mais de 90% dos crimes e dos quais 70% são
reincidentes... O máximo que pode acontecer são os indivíduos e famílias
vitimadas por crimes de menores terem alguma sentimento de justiça, alguma
sensação de que nem tudo sai impune nesse pais. Mas os efeitos enquanto
política que vá atua na resolução do problema da violência é praticamente nulo,
considerando que menos de 1% dos crimes são cometidos por menores.
E não esquecem
os interesses escusos que estão também por detrás dessa proposta, quem irá
lucrar com isso? Trata-se da mercantilização do aprisionamento de menores e de
pressão para privatização do sistema penitenciário para empresas privadas
lucraram milhões com essa política de encarceramento, o exemplo dos EUA é
emblemático nesse sentido, que tem mais de 2 milhões de pessoas encarceradas, sobretudo, negros.
E não me
interpretem equivocadamente, é claro que não quero que minha minha família seja
objeto da criminalidade de menores ou que esses – repito – saiam impunes de
seus delitos, quero dizer apenas que diminuir a idade penal apenas aumentará os
custos do Estado com aprisionamento sem repercussão alguma na causa ou raiz dos
problemas, atacando desta maneira apenas um sintoma da doença social que nos
afeta. Enfim, não se trata nem de defender diretamente a não diminuição da
menoridade penal, mas apenas indicar sua ineficácia enquanto política que visa
combater a criminalidade. Não, não existe pesquisa que mostre isso.
Até agora, de
maneira acritica, tem prevalecido a ideia de que é mais fácil e preferível punir
do que educar, que é preferível punir do que tornar mais eficiente ou modificar as políticas específicas existentes
para menores como é o caso do ECA; que é preferível punir do que atacar a raiz
dos problemas; que é preferível punir, colocar no banco dos réus e pagar 3 mil reais
por mês do que colocá-los no banco da escola; que é preferível – como indaga
Freixo - entregá-los para o tráfico e para milícia do que enfraquecer as
organizações criminosas; que é
preferível capitalizar politicamente em cima desse debate do que evidenciar o
que ele traz à tona das contradições brasileiras.