sábado, 16 de março de 2013

A novela da Telexfree continua: Quem salvará os consumidores de seus “salvadores””



Antes de qualquer posicionamento devo aqui novamente reiterar que  não me interesso em saber se a telexfree é  “golpe”, “fraude”, se é pirâmide", "vai quebrar",  ou se é "dinheiro fácil". Não isso não me interessa. Me interessa o que surge nas entrelinhas dessa polêmica, o que mostra das contradições de nosso Brasil e daqueles que informam sobre ele.

“ A novela da Telexfree está mais interessante que salve jorge” disse um internauta no interior da “polêmica Telexfree” que fervilha em blogs e sites de informação. De fato esta “novela” tem dado a  mim oportunidade de pensar questões antes restritas aos limites da academia e, por isso, retorno ao assunto que a principio só escreveria uma única vez.

Vamos ao assunto. Continuam a proliferar-se em sites e blogs denúncias contra - o ainda não comprovado -  “golpe” ou “fraude” da Telexfree. Parece que parte da dita “grande mídia” se despertou em relação ao assunto, a exemplo do portal G1.globo, Globo.com, só para ficarmos nesses. O que me impressionou a esse respeito é que o “pipocar” da “polêmica Telexfree” tenha sido gerada sobretudo por sites “alternativos” e depois migrou para “grande mídia” antes “silenciada”. É algo preocupante quando ocorre uma unanimidade, especialmente quando ela se realiza entre mídias que deveriam se contrapor no que se refere as informações publicadas, mas antes estão em coro uníssono.

Mais estarrecedor ainda é constatar que a mídia “alternativa” tem reproduzido mimeticamente pré-julgamentos e acusações sem qualquer comprovação ( vide Nassif ), incorporando inclusive, uma explicação sobre a questão que a reduz a um “esquema” ( de pirâmide ) realizado por “quadrilhas” que estariam a “iludir” o “pobre” e “desinformado”  povo brasileiro. Alem disso, fazem coro na reprodução de um argumento, segundo o qual, a “farsa” já estaria sendo descoberta e que em “breve” a “justiça” seria feita. Por fim, vale dizer, que todos acreditam piamente estar alertando o povo sobre os “falsários”, sobre a possibilidade de imediatamente eles fugirem do país com o dinheiro de um povo “sofrido” e “enganado”. Nada mais falso,como já insinuei em texto anterior.

Foi com tristeza que vi  o blog do Miro e o blog outraspalavras ( depois de Cartacapital ) capitularem diante da acriticidade de suas informações, decepcionando leitores que cotidianamente estão nesses blogs procurando ideias que apontam um horizonte pós-capitalista de existir. Espero que esses posicionamentos não se reiterem,de forma que tais blogs salvaguardem sua reputação e não ousem novamente a se igualar a “ grande mídia” que tanto criticam. É o que acontece quando todos reproduzem acriticamente um texto de  uma figura do mainstream do jornalismo brasileiro.

             Para não me alongar demais nesse texto vou me deter em “contra-informar” apenas a “informação” fornecida pelo portal G1. Globo do Mato Grosso, que no título de sua reportagem afirma que “Em 3 meses, Telex Free gera cerca de 2 mil denúncias ao Procon de MT”, simplesmente transformaram ligações para o PROCON em DENÚNCIA, em outras palavras, converteram o ato do cidadão se informar a respeito da legalidade de uma empresa em pura e simples acusação contra a mesma.
           É, está em curso uma “cruzada” dos representantes da legalidade, a mídia e o Estado, contra a suposta ilegalidade de uma empresa que tem “lesado” muitos consumidores. O que mais me intriga são duas coisas.
Primeiro, é o fato dos próprios consumidores estarem realizando uma defesa massiva da empresa nas redes sociais, para alem das críticas daqueles que, a priori, já sabem no que isso vai dar, ou seja, que a “pirâmide” vai "cair”. A defesa de uma empresa, de um lado, e o “esclarecimento” antecipado do que vai acontecer “com os mais pobres”, de outro, constituem um cenário efervescente nas redes sociais nos últimos dias.

Em segundo lugar é pouco comum vermos Mídia e Estado de mãos dadas contra o domínio do mercado. Até então o mercado era visto ( pelas elites e classes médias tradicionais ) como reino das “virtudes” onde ocorrem trocas “justas” entre iguais, pessoas igualmente informadas sobre os negócios que fazem, mas, de repente é mal visto ( através de uma empresa ) como reino de “injustiças” para com o povo brasileiro, devendo imediatamente apresentar documentos que comprovem sua legalidade, afinal de contas, estaria realizando trocas injustas, desiguais com os consumidores. Estes estariam sendo “lesados” na medida em que possuíam poucas informações sobre o produto adquirido e o funcionamento da empresa. "Coitadinhos!"

Ao que me parece o mercado só é mal quando começa a beneficiar demais os consumidores, nesse caso em particular, quando socializa parte dos lucros auferidos com o negócio ( No próximo texto me aterei a este ponto). A empresa parece estar profanando as leis “auto-reguláveis" de um mercado supostamente racional quando comete a “irracionalidade” de inverter ou pelo menos atenuar a lógica dominante, qual seja, a lógica segundo o qual as empresas devem lucrar infinitamente mais na sua negociação com os consumidores. “Um abuso” dizem eles, “como pode o consumidor ter tantos privilégios em um negócio”. O privilégio é, na verdade, a tendência de horizontalizar a pirâmide social brasileira, esta sim a verdadeira pirâmide a que todos deveriam criticar amplamente!

Obs: O título do portal G1 “Em 3 meses, Telex Free gera cerca de 2 mil denúncias ao Procon de MT” horas depois foi editado para “Em 3 meses, Telex Free gera cerca de 2 mil telefonemas  ao Procon de MT”

quinta-feira, 14 de março de 2013

O que a polêmica em torno do Telexfree evidencia: Captação de poupança popular ou democratização da lógica capitalista?


            Enquanto cientista social raramente emito opiniões imediatas  acerca de questões polêmicas que “fervem” nas redes sociais. Desta vez, porem, não me contive e vou arriscar algumas linhas de interpretação sobre a questão.
            Nos últimos dias prolifera-se nas redes sociais, blogs, youtube e jornais a polêmica em torno da atuação da empresa Telexfree, que está sendo investigada e já amplamente denúnciada pelos “arautos da boa e honesta informação”.
            Quanto às investigações existem suspeita de que uma espécie de  pirâmide financeira, travestida de Marketing Multi Nível, estaria lesando a “poupança popular” dos brasileiros, especialmente dos mais pobres que estariam vendendo tudo e se endividando apenas para entrar no “esquema”. Bem, o fato é que  mobilizaram imediatamente dois ministérios, promotores de várias regiões, cade, delegacias, ministérios públicos e policia federal para averiguar a questão. Alem disso Ministério da fazendo e  Secretaria de Acompanhamento Econômico (Sae), já estão envolvidos na situação e já foram notificados o  Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a Comissão de Valores Mobiliário (CVM) e o Banco Central (BC). Haja mobilização!
            Quanto aos representantes da “boa informação” e formadores de opinião, sobretudo, da classe média tradicional brasileira, destaca-se o Noblat, que tem escrito bastante sobre a questão nos últimos dias.
            Antes de prosseguir gostaria de sugerir que para quem não conhece a empresa favor procure informações no google. Meu objetivo aqui  não é discutir a legalidade da empresa,  seu serviço ( serviço de telefonia )o modo lícito ou ilícita que opera ( método de divulgação ) para proporcionar lucros ou realizar uma problematização moralista sobre a questão. Meu interesso é apontar para o que essa polêmica revela da sociedade brasileira. Aqui não importa  se é fraude ou golpe, embora devo concluir que não se trata nem de fraude, pois não estão falsificando nada e tampouco de golpe, visto que até onde eu sei a empresa não enganou seus ‘divulgadores’ recusando-se a realizar os devidos pagamentos.
            Retornemos ao formador de opinião, Noblat, apenas para iniciar meu posicionamento e sugerir o que essa polêmica traz à tona em tempos de suposta “despolarização política” e “despolitização das massas”.
            Para resumir a opinião de Noblat basta dizer que ele afirma que "Durante um ano, o esquema TelexFree envolveu um milhão de pessoas e movimentou mais de R$ 300 milhões através de uma versão online do velho golpe da pirâmide", e há expectativa de chegue em “1 bilhão” este ano. Informa que nos próximos dias, o esquema será desbaratado e seus mentores detidos e indaga “Mas terá sido em vão para mais de um milhão de pessoas que caíram no mais abrangente golpe financeiro da história do país”.
            Aqui reside minha principal indagação, será que essas pessoas são vítimas; caíram ingenuamente num ‘golpe financeiro’ e foram enganadas a colocar dinheiro no negócio? Creio que não e , tampouco acredito que seja “o mais atrevido golpe já perpetrado contra o consumidor brasileiro”. Outros golpes mais profundos atentam contra a dignidade do consumidor e do cidadão brasileiro cotidianamente, realizadas por “empresas golpistas” nos próprios termos de Noblat que afirma “O que diferencia uma empresa séria da golpista é a receita auferida com a venda final do produto.” Quer dizer com essa diferença podemos enquadrar muitos bancos de investimento como golpistas já que seus executivos ganham milhões mensalmente apenas vendendo seus produtos financeiros. Aliás não apenas bancos de investimento mas bancos estatais que “guardam” o dinheiro do brasileiro oferecendo ridículas taxas de retorno, ao mesmo tempo que lucram milhões com os empréstimos oferecidos ao governo, que nós sustentamos afinal. Somos ‘golpeados’ duplamente, afinal somos nós que sustentamos o Estado.
            Esse viés normativo, moralista da questão apenas identifica “golpistas” e “quadrilhas” que estariam se fazendo com a alienação popular  contudo, deixam de perceber que esses brasileiros estão longe desses adjetivos e não iriam aderir massivamente algo sem um mínimo de segurança, digo mínimo pois a maioria dos brasileiros não possuem segurança em relação a nada e quando percebem algo real, concreto e que pode mudar suas vidas encaram sem medo de perder, afinal , não há muito o que perder, apenas o anseio de melhoria de vida.
          O que essa polêmica sobre a telexfree revela? Pode revelar certamente o maior “golpe do século”   realizado por um “trabalho da quadrilha”, por uma “rede de golpistas”,como faz questão de enunciar Nassif,  incluindo-o  no rol de golpes já realizadas como o esquema ponzi, esquema boi gordo e esquema Madoff. Mas alem disso, o que essa controvérsia gera do ponto de vista sociológico, o que ela explicita sobre o Brasil e suas contradições, suas classes e o capitalismo.
            Nessa polêmica está em questão as “virtudes” de nossos elites, ricos e classes medias tradicionais, a possibilidade de indiferenciação financeira em relação a “massa”, que deveria não estar investindo e ganhando dinheiro “ilicitamente”, mas acordando 5 manhã, enfrentando ônibus, suando a camisa e se “matando de trabalhar” para receber seu “gordo” salário ao fim do mês.
          Acontece que a maioria das pessoas, e aqui incluo dezenas de opiniões de  internautas, se assumem como responsáveis pelos riscos do negócio, os “transgressores” nas palavras de Nassif. Tenho certeza que nunca eles se sentiram tão bem ao fazerem parte de uma transgressão, transgressão esta que atinge o núcleo da hipocrísia e das virtudes das elites  e classes medias tradicionais brasileiras ( alguns dos quais estão no “esquema”, mas não abrem o “bico” ). Em outras palavras, retiraria suas qualidades singulares de ganhar bem e enriquecer-se através de seu trabalho honesto, trabalho que pagaria políticas sociais para pobres preguiçosos e sem iniciativa que estariam naquela condição por sua própria culpa. O fato é que essas controvérsias dizem respeito sobre a singularidade de um Brasil desigual, injusto cuja lei 
           O que temos realmente? Será a democratização de investimentos ou , teríamos como informa a  Secretaria Nacional do Consumidor “a captação de poupança popular”, que estaria sendo denunciada.
         Considerando a primeira opção me pergunto, Dinamizar o capitalismo pela via popular seria dinamitá-lo por dentro? O bem da verdade é que sua dinâmica avassaladora de lucros e exploração ao longo da história tem beneficiado sobretudo as elites, os já ricos, herdeiros, empresários, investidores e instituições bancárias.
         A polêmica nos blogs giram em torno também dessa questão, afinal de contas, enquanto o capitalismo vai bem para os ricos e entra em crise ( através de ‘inovações’ financeiras como o subprime NOS EUA ), estes solicitam o Estado para assumir a responsabilidade, “resgatar” a economia ( diga-se o grande capital, como os mais 700 bilhões velozmente mobilizados para salvar os bancos americanos ) e socializar as perdas com a população ( diga-se, desmantelar o Estado de Bem-estar social com corte de salários, de aposentadorias,demissões, diminuição de investimentos na educação, saúde etc.. )
           Agora quando este capitalismo começa a beneficiar com suas inovações as classes populares os grande representantes do capital se sentem lesados. Caso o sistema se colapse, será que o Estado saíra pelas “vítimas” tal como sempre faz quando o mercado precisa de injeção de capitais, sempre ás custas da população mais pobre?
         As consequências diretas e indiretas do capital financeiro só se tornam sérias, escandalosas e problema de Estado quando seus lucros imediatos não vão para os bolsos dos bancos e grandes investidores. Quanto beneficia os “de baixo” ou a “nova classe média” o problema se torna seríssimo, uma questão nacional!
         Será que até o momento esse esquema não estaria  potencializando o investimento e a poupança popular? Será que a confiança dos “de baixo” no mercado não importa?  Vamos ver nas próximas semanas, meses e anos os desdobramentos no amâgo do capitalismo brasileiro.
         Alguns comentários em blogs indicam também uma corrente de indignação para com o Governo,  seus órgãos competentes, a grande mídia ( para alguns golpista ) e os “virtuosos” da elite brasileira, pois estes se  mobilizam imediatamente para investigar e tentar bloquear o “golpe” e os eventuais enriquecimentos ilícitos.
       Os comentários  indicam, por exemplo, que eles  não estariam gostando dos “pobres” ganhando tanto dinheiro,estariam com medo dos “pobres” se tornarem investidores e não dependerem mais da miséria do salário mínimo ou da exploração na qual estão encerrados em certos trabalhos que exigem sua alma para sua reprodução existencial.
       Os “batalhadores” virtuais assinalam que os “virtuosos” os acusam de se iludirem com “promessa de dinheiro fácil”, contudo,  se defendem afirmando que é a mesma  “promessa conhecido por muitos candidatos nas eleições brasileiras”.
Um internauta comentou que  “ Eike Batista ganhou R$ 1,37Bilhoes em um dia, com empresas que até o momento só apresentou projetos e nenhuma produção e ninguem investiga, isso tudo pq alimenta a corrupção no mercado financeiro”, outra afirma que ““O Brasil é um pirâmide. Trabalhamos para os "políticos" ficarem ricos. Porque nos tambem não podemos ter algo melhor?”
        Tá em xeque a própria dignidade do brasileiro, no sentido de ter uma vida decente, apesar das limitações do Estado brasileiro, está em questão um  trabalho decente, onde as pessoas  não “ se matam” de trabalhar para sobreviver.
        Vejamos ainda mais dois comentários que ilustram um pouco do que afirmei
“Estou desempregada e enquanto não consigo emprego me mantenho através da telex free sei que é um risco, mas na vida temos que arriscar!” outro acrescenta “ uns gastam com drogas, outros com mulheres, outros com remédios, com loterias e alguns com internet”, por fim vale registrar que “Todos os anunciantes são maiores de idade, todos tem portanto personalidade e capacidade jurídica para tomarem suas próprias decisões.Não existe nada 100% seguro. Todos sabem que podem ganhar e que também podem quebrar a cara”. Procurem esses registros no google!
         Como se percebe essas pessoas em sua grande maioria possuem consciência dos riscos que envolvem esse negócio e deixam claro que se trata de uma escolha, que é “um risco como qualquer outra empresa”, que “fazem o que quiser com seu dinheiro” e isso não diz respeito, segundo alguns internautas,  a  procuradores e polícia federal, estes deriam é estar atrás de “políticos corruptos”, “sonegadores de impostos” etc..
        Ora, o Brasileiro das classes “baixas”, reitero, não é  simplesmente um ser “alienado e  que segue uma ilusão como manada”, como muitos comentaristas de plantão argumentam, esses brasileiros não devem ser vistos como vítimas, massa de manobra, sem opinião e joguete da grande mídia, mas sim como sujeito que “sabe a dor e o prazer de ser o que é”, que a despeito da educação que teve e do país que nasceu, não sucumbi a miséria herdade e a converte criativamente em arma de luta, resistência e afirmação de sua dignidade. Se afirma como sujeito que assume seus riscos sem medo das consequências, até porque nunca ou raramente teve o conforto daqueles que não precisam ousar, daqueles que apenas reproduzem de forma mesquinha e conservadora suas vidinhas.
          Por fim, vale registrar que a guerra virtual em torno dessa questão é tambem uma guerra ideológica, expressa em  um posicionamento contra-hegemônico de milhares de internautas contra  aqueles que tentam bloquear o sonho brasileiro de “viver sem se matar trabalhando”. É a luta de classes transposta para o mundo das redes virtuais, é a luta de classe virtual”
            O fato é que a ampla maioria das pessoas está consciente dos riscos e não precisará, tal como tem ocorrido nos Eua e europa, pagar as contas de rombos causados por instituições financeiras e suas inovações financeiras. Essas pessoas pagaram, finalmente, por suas próprias escolhas e não pelas escolhas ocultas e anti-democráticas do grande capital financeiro. Eis que  a lógica do capital quando ousa se democratizar abala os fundamentos de sua própria reprodução, em outras palavras, talvez ( o que não é novidade desde Marx ) o colapso do capitalismo seja realizada no futuro precisamente por sua própria lógica, a partir de de suas próprias armas ( produtos financeiros por ex ) colocadas nas mãos da multidão.
            Respondendo sucintamente o sub-título do texto, a  polêmica em torno da telexfree revela entre outras coisas  as vísceras ideológicas classistas de um Brasil injusto, desigual, corporativo e, é claro, com os seus iluminados jornalistas, sempre dispostos a “prestar serviço a sociedade”, só não sabemos que sociedade, ou melhor, que segmento ou classe dela, certamente não é a de “burros”, “vagabundos”,” ignorantes”, e “ mal informados” que se “iludem” com o telexfree.