sexta-feira, 14 de junho de 2013

As expressões do Movimento Passe Livre: Vandalismo ou exercício democrático?


A polêmica é sempre oportunidade para dialéticas de esclarecimento, para alargamento de percepções e consciências, para realização do debate democrático.


Vejo pulular na rede tanto textos e vídeos contrários ao MPL ( Movimento Passe Livre ) quanto aqueles  que o apoiam, voltados a evidenciar a violência estatal através de seus aparelhos repressivos. O movimento aparece ora representando todos, ora representando ninguém. A massa ou o povo, segundo os textos e vídeos disponíveis, adquire contornos, dedos e corpo da classe média, da mídia dominante, dos jovens delinquentes, burguesia fascista, partidos da esquerda à direita . Essa pluralidade de referências ao movimento e suas interpretações refletem a posição social, política e existencial daqueles que “informam” suas versões, opiniões, críticas e verdades. O fato é que o movimento não pode ser reduzido a nenhumas dessas interpretações, na verdade, a maioria são, de um lado, desqualificações do movimento e, de outro, petistas, esquerdistas e tucanos se acusando reciprocamente na busca dos responsáveis pela situação.
            Alguns afirmam que não teriam trabalhadores no movimento, só  jovens da classe média,”playbois”, “rebeldes sem causa” que nem sentiriam “o peso das passagens”, mas isso seria motivo para desqualificar a luta e suas atitudes?  As pessoas só se engajariam em causas que dizem respeito a sua classe?
Há aqueles que insinuam que o movimento foi muito espontâneo, sem bandeiras, lideranças, a partidário etc.Mas há igualmente aqueles que afirmam que o movimento seria programático e não teria nada de espontaneidade; partidos políticos esquerdistas e tucano estariam alí  infiltrados, direcionando ações,  manipulando as “massas” para atacar o governo petista. Seria uma oportunidade ímpar para tal intento. Seriam simplesmente uma massa de manobra usada pela direita e pela mídia hegemônica? Estariam apenas depredando patrimônio público e deslocando policiais para atividades improdutivas? São perguntas que expressam no mínimo uma pobreza analítica sobre o movimento, não visualizando nele capacidade inventive, reconstrutiva, possibilidades de realização democrática, controle e pressão social sobre as instituições que governam este país.
Não podemos negar os diferentes discursos, críticas e desqualificações revelam facetas do tema em questão, qual seja; o transporte público enquanto “direito a cidade” e a legitimidade ou não dos movimentos que almejam esse direito.
É importante reconhecer que  existe tudo isso junto e muito mais, são muitas intenções, interesses, desejos, singularidades em jogo, mistura de ações programáticas com espontaneísmos, oportunidades para se sentir útil etc... não podemos realizar diagnósticos simplistas e unilaterais do tipo “isso é uma ação programática da direita que manipula a massa”, “trata-se de ação da extrema esquerda com a direita para desestabilizar o pt”, “ isso é um ato irracional de vândalos”, isso é…..x, y,z. Pelo que li a coisa é muito mais complexa do que muitos imaginam, o movimento envolveu para o bem ou para mau classe média, classe trabalhadora ou “nova” classe média,  movimentos ecológicos, movimentos de habitação, movimentos de “direito a cidade” e outros.
O movimento é necessário,  componente indispensável de mudança social, econômica e política. Mas nunca esqueçamos que ele nunca é homogêneo, mas sempre plural, contraditório, sujeito a muitas determinações e, igualmente, a desdobramentos insuspeitados.
Tais situações, penso, permitem insurreição de consciências, momento de politização sobre os problemas nacionais. Não, sem essa de que eles são apenas  “massa”, objeto de manobra, é também multidão de singularidades que se reinventam no calor das lutas, que reorientam energias e ideias para construção do comum! ( Passe livre!) O movimento é também movimento de subjetividades; não se resume a contestar alguns centavos de aumento mas representa um sintoma da insatisfação geracional com o modelo de política e de desenvolvimento realizado pelo Brasil ( e pelo Mundo ) nas últimas décadas neoliberais. Sim, está em causa os sentidos e ambivalências do Lulismo, depois de alimentada a multidão quer mais! Em boa parte surgida no âmbito do governo do PT, a “nova classe média” que ao contrário do que alguns analistas pensam (  classe despolitizada e consumista ) é também classe subjetivamente crítica e criativa; que uma hora cessa de aguentar porretes e exploração e afirma-se, como diria Bruno Cava, como força viva e produtiva de outro mundo.
Por fim, ao realizar diversas leituras pela rede percebi como nostalgias e utopias também se apresentam igualmente no horizonte de lutas, práticas ou ideológicas. A nostalgia se apresenta com  a referências aos movimentos pretéritos, suas conquistas e uma pretensa autenticidade quando comparado aos atuais. A utopia aparece seja como fonte de inspiração para mudança ( Pró-MPL ) ou ainda como fonte de resignação para manutenção do “status quo” ( Contra-MPL ) supostamente desqualificando a idéia de Passe Livre como uma realização impossível, utópica.  Ora, ser utópico atualmente é a maneira mais realista de existir em um mundo com crises múltiplas que atentam contra a justiça e dignidade humana.


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